segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

SOLILÓQUIO À MINHA MÃE - 1982



      Nazareno Lima e Chico Mendes

Tuas riquezas, ó Mãe, ilimitadas
Pela força natural que ainda fustiga,
Um dia queimarás como a urtiga,
A quem de ti hoje faz queimada!

A mau tendência que ao meu ser fustiga...
Do ser humano, a hereditária herança:
Com todas as forças faria a vingança,
Como com esta sociedade eu faço intriga!

Vejo ao longe ... O sol sair da terra
E na terra, ao longe vejo o sol entrar:
No cinéreo céu nada há para me assombrar
E o odor de fumaça lembra-me uma guerra!

Perco-me visualmente no vago espaço...
Atordoado, ouço o ranger das selas...
No mesmo lugar onde fazíamos as pélas,
Hoje já não sei mais o que eu faço!

Mãe – Antes de ver-te totalmente morta,
Minha consciência ainda teima,
Em amaldiçoar a tudo que queima
E esconjurar a tudo quanto corta!


Quem habita aqui, hoje é espancado
Com violências ... Com opressões ...
Enquanto ouço o ruído dos caminhões
Que ao invés das pélas carregam gado!

Ó Mãe minha! Tal qual tua ferida,
Sinto hoje o ardor desta revolta ...
Ecoando este grito que o meu peito solta,
No desespero da opressão da vida!

Eis tantos cernes na grande relva ...
Cuja seiva já alimentou a terra;
Feridos ao tronco pelo motor que serra,
No início da repressão desta selva!

Como um vale que a outro vale encerra;
Tal a colina que a outra colina encobre;
Sinto a pior das injustiças feita a um pobre
E a violência feroz da guerra!!!

Pode, a Química à serviços da vida,
Com seus poderes equidistantes,
Fabricar os mortíferos desfolhantes,
Para sacrificar nossa Mãe querida???

Um comentário:

  1. Esse poema que faz parte do livro "Solilóquio à Minha Mãe", escrito pelo poeta Nazareno Lima e o Ecologista Chico Mendes em 1982, retrata a aversão que o Seringueiro sentia dos devastadores da Floresta.

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