quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

"SOLILÓQUIO À MINHA MÂE - Nazareno Lima e Chico Mendes - 1982



 Parte III


Sinto pavor quando escrevo, porém,
A verdade digo neste texto pequeno;
Falo realmente do homem obsceno,
Que na minha terra não faz o bem!

Tuas riquezas, ó Mãe, ilimitadas
Pela força natural que ainda fustiga:
Um dia queimarás como a urtiga,
A quem de ti hoje faz queimada!

A mau tendência que ao meu ser fustiga...
Do ser humano, a hereditária herança:
Com todas as forças faria a vingança,
Como com esta sociedade eu faço intriga!

Vejo ao longe ... O sol sair da terra
E na terra, ao longe vejo o sol entrar:
No cenéreo céu nada há para me assombrar
E o odor de fumaça lembra-me uma guerra!

Perco-me visualmente no vago espaço...
Atordoado, ouço o ranger das selas...
No mesmo lugar onde faziamos as pélas,
Hoje já não sei mais o que eu faço!

Mãe – Antes de ver-te totalmente morta,
Minha consciência ainda teima,
Em amaldiçoar a tudo que queima
E esconjurar a tudo quanto corta!

Pôr que fizeram esta contradição?
Transformar-te nesta grande alfombra!
Onde antes eu só andava na sombra
E só via fogo, acendendo o fogão!

Tal qual a nudez das meretrizes;
Esta terra despida me entristece!
Enquanto tudo isto acontece,
Nossa Ecologia perde as raízes!

A inchação das cidades escorraça
A composição natural das simbioses...
Chama a miséria humana em altas vozes
E cria o ser moderno em ameaças!

Porém não nega a justiça, a Natureza:
Esta vetusta região que o exótico ataca:
Seus restos mortais; tanino ou laca,
Cobrará aos netos inimigos, com certeza!

Mãe! Eu porém sei que vais revidar,
Disso, até eu próprio sinto medo:
Antes que se intemperize um penedo,
Há de expulsá-los para não mais voltar!

Cara “peitica”, cale seu triste canto...
Após a “friagem”, o verão chega:
Deixai cantar os que chamam quem rega
A este futuro campo santo!!!

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